Um adeus descolorido
Todo o azar do Mundial reunido em 90 minutos impediu Portugal de repetir o terceiro lugar do Inglaterra’66. Foram muitas coisas a correr mal numa exibição que teve muitos momentos bons, mas também houve aselhice e más opções
Portugal despediu-se do Mundial com uma derrota pesada e por números que não correspondem nem de perto nem de longe ao que se passou em campo. Foi como se de repente todos os azares disponíveis caíssem sobre a equipa das Quinas. Ricardo fez um grande campeonato mas ontem foi mal batido no primeiro golo; a equipa mostrava capacidade de reacção e Petit, ao tentar um alívio, assinou um autogolo; Metzelder cabeceou para a própria baliza mas acertou com a bola no guarda-redes; Scolari manteve em campo um ponta-de-lança inoperante durante mais de uma hora; Petit entrou ao intervalo e esteve envolvido nas jogadas dos três golos sofridos. Um acumular de situações estranhas que contribuíram para uma desfeita que não apaga o que está para trás, mas também não é um final condizente com o resto do percurso.
A Alemanha festejou o triunfo como se do título se tratasse, porque, apesar do confronto dos números, os alemães também sabem que num jogo em que as coisas tivesse corrido com mais normalidade não teriam ganho. Fica uma chapelada para os dois tiros de Schweinsteiger (três com o que originou o autogolo de Petit), porque, de resto, o herói germânico na conquista da medalha de bronze foi o guarda-redes Kahn.
No alinhamento do onze, para além das substituições obrigatórias – Paulo Ferreira em vez de Miguel (lesionado) e Ricardo Costa no lugar de Ricardo Carvalho (castigado) -, Scolari optou por deixar Figo no banco e dar a titularidade a Simão. Uma opção aceitável, apesar de inesperada, mas é preciso explicar desde já que o capitão entrou demasiado tarde.
No dia da despedida, Figo deveria entrar para a glorificação – ainda assim foi aplaudido por todo o estádio quando entrou – mas face ao decorrer da partida esteve tempo a mais fora, enquanto Pauleta – também de saída - esteve tempo a mais dentro, porque desde a primeira parte se via que as marcações à zona da Alemanha pediam a presença de Nuno Gomes, um jogador que foge aos polícias e sai da área para jogar em tabelas. É que o futebol de Portugal, com Deco, Maniche, Ronaldo e Simão em grande, precisava de outro tipo de correspondência na zona central, ou então um matador de área mas que o fosse de facto.
Com ambas as equipas a quererem mesmo ganhar, a primeira parte foi competitiva e bem jogada. Aqueles jogadores, de ambos os lados, estavam ali a tentar provar que mereciam que este jogo fosse a final, que apenas se disputasse hoje, em Berlim e não em Estugarda. Ao jogo quadrado e previsível dos alemães, mas perigoso, porque rápido, forte e bem executado (naquele estilo, obviamente), Portugal contrapunha um Deco como ainda não se tinha visto no Mundial, extremos rápidos, laterais mais fortes a subir do que a defender, passe curto alternado com diagonais a rasgar a defesa alemã. Os buracos iam aparecendo, mas alguma imperícia e Khan resolviam os problemas dos anfitriões, embora também tenha de referir-se que do outro lado Ricardo também parou duas bolas perigosas e Costinha, para matar um jogada de perigo, teve de levar um amarelo que o deixou à porta da rua.
Tudo ao contrário
A troca de Costinha por Petit ao intervalo era, claramente, uma boa ideia. Saía um jogador que actuava limitado numa zona de muita luta e entrava outra de características parecidas, forte fisicamente, limpo. Saiu tudo ao contrário. Petit não fechou a entrada da área e deixou Schweinsteiger chutar no lance do primeiro golo, embora Ricardo devesse ter feito muito melhor; pouco depois, o mesmo Petit fez autogolo ao tentar um corte e, mais tarde, deixou que Schweinsteiger bailasse na frente dele antes de disparar o míssil que deu o terceiro golo, este sem defesa possível.
O caricato da situação é que Portugal continuou a jogar bem mesmo depois de sofrer os golos. A perder por dois, Scolari tirou Nuno Valente e meteu Nuno Gomes, que foi colocar-se ao lado de Pauleta, enquanto Paulo Ferreira passou para lateral-esquerdo e Petit foi para a direita. A seguir saiu Pauleta e entrou Figo. Tarde de mais. Klinsmann renovou o ataque – fez trocas directas – mas nem com isso conseguiu segurar o caudal ofensivo dos portugueses, que viram Khan roubar golos a Deco e Ronaldo, numa altura em que a equipa atacava com seis homens.
O golo de honra de Nuno Gomes teve um sabor a pouco, tanto pelos números finais da partida como pela dúvida do que poderia ter acontecido se tivesse entrado pelo menos ao intervalo, que os deuses da fortuna ainda não tinham virado as costas à equipa portuguesa.
Jogar como Portugal jogou durante a maior parte dos 90 minutos e ir para casa vergado a uma derrota por 3-1 não faz sentido. O futebol é assim, porque nem sequer se pode falar de descompressão.
Ficha de jogo
Estádio Gottlieb-Daimler Stadion, em Estugarda relvado: bom estado espectadores: 52.000 árbitro: Toru Kamikawa (Japão) assistentes: Yoshikazu Hiroshima (Japão), Dae Young Kim (Coreia do Sul) 4º árbitro: Coffi Codjia (Benim)
Alemanha 3 - Portugal 1
GOLOS [1-0] Schweinsteiger 56', [2-0] Petit 61', p. b., [3-0] Schweinsteiger 78', [3-1] Nuno Gomes 88'
Alemanha
12 Oliver Kahn GR
16 Philipp Lahm LD
21 Metzelder DC
6 Nowotny DC
2 Jansen LE
5 Kehl MD
8 Frings MD
19 Schneider AD
7 Schweinsteiger AE 79'
20 Podolski AV 71'
11 Klose AV 65'
T: Jurgen Klinsmann
1 Lehmann GR
23 Hildebrand GR
4 Robert Huth DC
22 Odonkor AD
15 Hitzlsperger AE 79'
9 Hanke AV 71'
10 Neuville AV 65' 1
4 Asamoah AV
Amarelos 7' Frings; 78' Schweinsteiger
Portugal
1 Ricardo GR
2 Paulo Ferreira LD
5 Fernando Meira DC
4 Ricardo Costa DC
14 Nuno Valente LE 69'
6 Costinha MD 45' 1
8 Maniche MD
20 Deco MO
11 Simão AD
17 Cristiano Ronaldo AE
9 Pauleta AV 77'
T: Luiz Felipe Scolari
12 Quim GR
22 Paulo Santos GR
3 Caneira LE
8 Petit MD 45'+
10 Hugo Viana MO
19 Tiago MO
7 Luís Figo AD 77'
15 Boa Morte AE
21 Nuno Gomes AV 69'
23 Hélder Postiga AV
Amarelos 24' Ricardo Costa, 33' Costinha, 60' Paulo Ferreira